JC e-mail 3860, de 01 de Outubro de 2009.
"Por ser muito nova, a nanotecnologia ainda enfrenta preconceitos e equívocos"
Ethevaldo Siqueira escreve para "O Estado de SP":
Nanotecidos não molham nem mancham. Nanocristais de óxido de zinco podem ser utilizados para fabricar telas ou filtros solares invisíveis, capazes de bloquear a luz ultravioleta. Nanocristais de prata matam bactérias e previnem infecções. O nanoalumínio é um perigoso explosivo.
A nanoplatina é um catalisador incrível, que acelera a velocidade das reações químicas. O ouro nanométrico tem propriedades radicalmente diferentes desse metal em seu estado normal. Uma faca de cozinha com fio de corte nanométrico é um instrumento tão afiado que bastará encostar levemente na pele e já estará cortando.
Aplicações práticas de substâncias e produtos como esses, que parecem mágicos, começam a fazer parte de nosso cotidiano, como resultado do progresso da nanotecnologia, um dos campos emergentes mais fascinantes e promissores da ciência e da tecnologia. Altamente interdisciplinar, a nanotecnologia envolve física, química, biologia, ciência dos materiais e praticamente todas as disciplinas da engenharia.
Segundo Henrique Eisi Toma, professor titular do Departamento de Química Fundamental do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), considerado um dos maiores especialistas nessa área no País, "a nanotecnologia fará uma revolução muito maior do que a da microeletrônica, e fará surgir especialidades tecnológicas ou industriais como a nanoquímica, os nanoplásticos, os nanotêxteis, a nanoeletrônica e até os nanocosméticos".
Para se ter uma ideia mais clara da nanotecnologia, é essencial que compreendamos o mundo nano, ou seja, o mundo das dimensões muito pequenas. Em grego, nanós significa anão. Daí a palavra nanico.
Recordemos que o metro tem 100 centímetros. Ou mil milímetros. Ou um milhão de micrômetros. Ou um bilhão de nanômetros. Por outras palavras, um nanômetro equivale a um bilionésimo do metro. Vale lembrar ainda que um nanômetro pode comportar até 7 átomos alinhados. E um nanotubo de carbono é 100 mil vezes mais fino que um fio de cabelo. Conceitualmente, é bom lembrar que a nanotecnologia trabalha com partículas ou objetos que têm entre dez e 100 nanômetros.
O mais surpreendente nesse mundo nanométrico é que os materiais construídos nessa escala apresentam propriedades físicas e químicas bastante diferentes, graças aos efeitos da mecânica quântica.
O professor Toma explica que existem duas razões principais para as diferenças qualitativas no comportamento dos materiais em nanoescala. Primeira: os efeitos da mecânica quântica que se manifestam e passam a atuar nas dimensões muito pequenas e conduzem a uma nova física e nova química. A segunda é a relação entre uma superfície muito grande e o volume dessas estruturas.
O primeiro cientista a conceber a ideia da nanotecnologia foi o físico norte-americano Richard Feyman, ao proferir, em 1959, uma palestra na Sociedade Americana de Física, com o título de Há muito espaço lá em baixo (There"s plenty of room at the bottom). Ele começou sua palestra observando que a oração do Pai Nosso já havia sido escrita sobre a cabeça de um alfinete. Em seguida, perguntou ao auditório: "Por que não podemos escrever os 24 volumes da Enciclopédia Britânica nessa mesma cabeça de alfinete?"
Por ser muito nova, a nanotecnologia ainda enfrenta preconceitos e equívocos. Para refutá-los, o professor Henrique Toma, lembra: "Nosso mundo é essencialmente nanométrico. Ou seja, o mundo nano não é coisa nova, artificial, criada pelo homem. Ele está na natureza e em nós mesmos, nas biomoléculas que promovem a vida. Ele está no arco-íris, na asa da borboleta, no brilho das pedras e do asfalto, e em tudo que ingerimos, do leite ao café, e muita coisa que respiramos".
Diversos fenômenos da natureza têm inspirado pesquisas em nanotecnologia, como, por exemplo, as características das patas das lagartixas que andam no teto sem cair. Ou no mundo das cores, pois as ondas de luz têm dimensões nanométricas. Até a cor azul dos olhos das pessoas é um bom exemplo porque não decorre de pigmentos, mas de um fenômeno do mundo nano.
"Muitos setores da tecnologia já trabalham nessa área", explica o professor Toma, "com o propósito de produzir revestimentos coloridos sem o uso de pigmentos, ou que mudem de cor por meio de estímulos físicos ou químicos (efeito camaleão)".
Há substâncias que têm uma grande afinidade pela água e, por isso, são chamadas de hidrofílicas. Outras, contrariamente, têm repulsa. São as hidrofóbicas. Sobre elas a água não consegue permanecer parada e acaba carregando todos os detritos de sujeira, tornando o material autolimpante. É o conhecido como efeito Lótus, observado através das gotículas brilhantes de água que ficam dançando sobre as folhas dessa planta aquática.
Esses fatos não são mera curiosidade. Na realidade, com base no efeito Lótus, a nanotecnologia deverá criar tecidos e revestimentos autolimpantes, para produtos como roupas de trabalho, capas de chuva e artigos esportivos.
Mais informações e a íntegra da entrevista do professor Henrique Toma estão no meu site www.ethevaldo.com.br
(O Estado de SP, 27/9)
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